quarta-feira, 30 de junho de 2010

Ogum e Oxum recebm a visita de Baba-Égum


Ogum e Oxum recebem a visita de Babá-Égum

Conta a lenda que Ogum, rei dos ferreiros, morava com sua companheira, a bela Oxum, rainha dos rios. Oxum ajudava Ogum no seu trabalho carregando docilmente seus instrumentos de casa à oficina e manejava o fole para ativar o fogo de sua forja.
Ogum criava as ferramentas, para todos os tipos de trabalhos, para o progresso dos homens, criava as coroas dos reis e as armas dos guerreiros. Ele trabalhava com muita habilidade o ouro dado por sua esposa, a prata dada por sua mão e o ferro que era de sua própria existência. Ogum, senhor de toda a tecnologia que existiu, que existe e que ainda existirá.
Dia e noite ouvia-se o som do metal sendo batido na bigorna ao ser moldado pelas mãos do hábil Ogum. a fornalha de sua forja era mantida sempre pelos pés de Oxum movendo o fole. Quando se passava naquele lugar se ouvia "tidam-tidam, kotu-kotu", e toda a aldeia era embalada por estes sons.
Um belo dia, um Babá-Égum veio até a aldeia assustando a todos, que desapareceram atrás de portas e janelas fechadas. isso muito entristeceu Babá-Égum que decidiu partir, no entanto, ao passar pela casa de Ogum e Oxum ouviu: tidam-tidam, kotu-kotu, tidam-tidam, kotu-kotu... Babá-Égum encantou-se com estes sons e começou a dançar, dançar e dançar, balançando suas belas vestes aos sons do rei ferreiro. as pessoas da comunidade vendo aquele aquele espetáculo pelas frestas das portas e janelas ficaram curiosas e começaram a se aproximar. Logo todos estavam batendo palmas ao ritmo dos sons da bigorna e do fole, animando ainda mais a dança de Babá-Égum que rodopiava, ora muito alto, hora muito baixo. A comunidade encantada com a dança atirava muitas moedas aos seus pés.
Ogum e Oxum ouvindo as palmas pararam o trabalho para ver o que acontecia. E ao abrir a porta viram Babá-Égum, que lhes fez reverencia e lhes ofertou muitas moedas. Logo depois, em um rodopio desapareceu no ar.

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Racismo na Copa

por Luiz Carlos Azenha
“O negro é cientificamente mais forte”, disse um ilustre comentarista, em tom de elogio, a respeito da seleção da Costa do Marfim. Um narrador chegou a sugerir que sobra força física mas falta inteligência aos times “africanos”, razão que estaria na base do suposto fracasso das seleções do continente em avançar para a segunda fase.Bem-vindos à cobertura da Copa do Mundo da África do Sul.

Curiosamente, nos dois casos, provavelmente sem saber os “profissionais” reproduziram teorias cujo objetivo era fornecer justificativa intelectual para a ocupação física da África pelo colonialismo europeu.

Resumindo grosseiramente, essas teorias pregavam a superioridade natural dos europeus brancos sobre os nativos, que seriam “fortes”, mas “preguiçosos”, “lascivos” e “intelectualmente inferiores”. Essas
constatações serviam, naturalmente, para justificar as ações europeias na África: o controle das terras, dos recursos naturais e a utilização dos negros “fortes” como mão-de-obra escrava ou semi-escrava.
Justificavam, inclusive, o controle das rebeliões da mão-de-obra com o uso de métodos violentos (no Congo, os agentes do rei belga Leopoldo cortavam as mãos dos trabalhadores que não cumpriam as cotas de extração
de borracha natural).

Os negros, afinal, não eram apenas atrasados. Eram bárbaros, representavam com sua “lascividade” uma ameaça física às mulheres brancas, símbolo máximo da “pureza” da civilização europeia, especialmente na era vitoriana. Vem daí o mito do superpoder sexual dos homens negros (assim como, na Segunda Guerra Mundial, a propaganda americana espalhou o mito de que os orientais são sexualmente pouco dotados em termos de centimetragem).

Para justificar a barbárie, surgiram pseudociências como a frenologia, que pretendia comprovar que as características de um ser humano podiam ser definidas pelas formas da cabeça. Os “cientistas” passaram a se dedicar, por exemplo, a medir o tamanho da cabeça de brancos e negros, encontrando nestes desenhos cerebrais que eram “prova definitiva” de sua inferioridade. Quando os alemães ocuparam as terras
do povo herero, no que hoje é a Namíbia, por exemplo, provocaram uma rebelião que foi esmagada com uma guerra de extermínio e a implantação de campos de concentração para a população civil. Destes campos sairam dezenas de cabeças de prisioneiros mortos, remetidas para a Alemanha para “estudos científicos”.

Assim como os campos de concentração foram primeiro implantados na África (pelos britânicos, na guerra contra os bôer, pelo controle do que hoje é a África do Sul), as teorias que mais tarde seriam aplicadas por
Josef Mengele em Auschwitz foram “testadas” pelo pai da eugenia, o médico e antropólogo alemão Eugen Fischer, na África.

Dizer, hoje em dia, que todos os africanos são fortes a partir do exemplo de 11 jogadores da seleção da Costa do Marfim é o mesmo que presumir que todos os estadunidenses são gigantes a partir da observação
de um jogo de basquete entre os Lakers e os Celtics. Embora os brasileiros dominem há anos as competições de vôlei masculino, não há nenhuma razão para acreditar que sejamos “naturalmente dotados” para a
prática do vôlei.

O que os nossos comentaristas, narradores e “jornalistas” deveriam se perguntar é razoavelmente óbvio: por que a seleção da Costa do Marfim é musculosa assim? Será que os africanos nascem com aqueles biceps e
triceps “naturalmente” desenvolvidos?

Talvez eles encontrassem explicação no fato de que os jovens jogadores de futebol de alguns países da África — Camarões, Gana e Costa do Marfim, por exemplo — mal fazem estágio em equipes locais antes de
ir para a Europa. Muitos destes jogadores são recrutados na pré-adolescência por caça-talentos que servem a escolinhas de formação de jogadores. No caso de Costa do Marfim, por exemplo, a escolinha mais
importante do país vende um jogador jovem (18 a 21 anos de idade) para times de segunda ou terceira divisão da Europa por cerca de 600 mil dólares. Como o contato físico no futebol europeu é tido como uma
característica do jogo, é apenas natural que tantos os preparadores quanto os próprios atletas trabalhem para “bombar” o físico. Não é diferente com jogadores brasileiros (vide a transformação física do
Ronaldo, por exemplo). Muitas vezes um bom jogador brasileiro, como o Neymar, é tido como “muito franzino” para enfrentar o rigor do futebol europeu. E tome musculação, para não falar em hormônios e outros métodos
clandestinos.

Pessoalmente acredito que essa é uma tendência suicida para o futebol arte: a produção em massa, em todo o mundo, de super-atletas destinados a suprir as necessidades de mão-de-obra das ligas europeias, jovens
precocemente “bombados” e com pouco domínio dos fundamentos básicos do futebol (notem a qualidade bisonha dos chutes a gol na Copa do Mundo da África do Sul). Mas isso é outro assunto.

O que espanta, mesmo, é ver gente com alto poder de influência sobre o grande público repetir, em pleno século 21, preconceitos que nasceram de teorias racistas do século 19. São, afinal, apenas dois séculos de
atraso.

Fonte: http://www.viomundo.com.br/opiniao-do-blog/e-depois-ainda-dizem-que...

Título original: E depois ainda dizem que Dunga é o atrasado

terça-feira, 22 de junho de 2010

África está na moda

Nunca se viu falar tanto de África desde o período de expansão do império europeu e dos massacres existentes durante as guerras por independência. Os valores culturais desta civilização estão em alta no mercado mundial devido à realização da 19ª edição da Copa do Mundo FIFA de 2010.
Agora os olhares estão para o continente África, em especial o país da África do Sul, só para lembrar. Entretanto toda essa avalanche de reportagens, noticiários e artigos nos faz refletir tanto sobre as questões históricas das invasões européias nos países do continente africano quanto os reais benefícios que a Copa do Mundo de Futebol traz para a população sul-africana negra.
O que percebemos é que os sul-africanos negros estão, mais uma vez, abrindo as portas do país, da cultura e costumes e casas para os estrangeiros invasores. Dizem que existe uma satisfação em receber os visitantes da mesma forma que foi dito durante o período das invasões territoriais, parece até que não existiram guerras contra as incursões portuguesas naquele período em que milhares de negros foram retirados de suas terras, de sua cultura e colocados, como escravos, nos porões de navios sendo transportados para o outro lado do continente. E hoje, durante a copa, as guerras deixaram de acontecer? E as manifestações pelos salários combinados?
Para os ditos invasores, as informações sobre os costumes, cultura e valores dos sul-africanos são novas, surpreendente, mas não deixa de considerá-los como primitivo. Fala-se de Apartheid, Nelson Mandela, Vulvuzelas, reis zulus, mas não escondem o medo da violência. Ou seja, se por um lado acontece o reconhecimento de uma civilização legitima por outro se abre margens para o seu recalque.
Será que os nossos irmãos estão inclusos no processo de globalização ou irão continuar a margem do desenvolvimento tecnológico mundial? Mas será que eles querem estar inclusos? Não podemos esquecer que quem produz, investe e financia este evento é o branco. E nossa relação com este nunca se deu de forma espontânea e natural. Será que desta vez poderemos confiar nos brancos?
Enfim, é momento de burlar fronteiras existentes entre negros e brancos. Mas será que isto é real? Mas como moda é algo que dura por apenas um determinado período sabemos que estas questões sobre África, segregação racial não irá permanecer por muito tempo no pensamento da população mundial.

Por Lucinete Araújo

Abdias: Se pudessem, colocavam o negro de novo na escravidão

Defensor fervoroso do sistema de cotas raciais em universidades públicas, o ex-senador e deputado federal, Abdias do Nascimento, 96 anos, um dos líderes negros de maior expressão no país, considerou "uma coisa lamentável" as alterações no texto original do projeto de lei que institui o Estatuto da Igualdade Racial, aprovado nesta quarta-feira (16), no Senado.


Um dos pontos mais criticados foi, justamente, a retirada do trecho que falava sobre a regulamentação da reserva de vagas para a população negra na educação. O estatuto, que tramitou no Congresso durante sete anos, entra em vigor após a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. -As cotas são absolutamente importantes. São um passo adiante da degradação que o negro tem sofrido durante tantos séculos.



Confira a entrevista


Terra Magazine - O Senado aprovou ontem projeto de lei que institui o
Estatuto da Igualdade Racial. O texto original sofreu alterações, como a
retirada do trecho que previa cotas para negros na educação e a criação
de uma política de saúde pública para negros. O que o senhor achou das
mudanças?
Abdias do Nascimento - Uma coisa lamentável, porque se há uma população que necessita de um apoio específico em todos os sentidos, em todos os níveis das atividades nacionais são os negros.
São os únicos que foram escravos. As pessoas falam que não precisa de uma proteção, mas ninguém foi escravo aqui, a não ser os africanos.

Então, na avaliação do senhor, as mudanças foram lamentáveis.
É claro. Lamentável, porque é uma injustiça a mais. Uma injustiça que se
repete.


O relator do texto, senador Demóstenes Torres (DEM-GO), substituiu o
termo "raça" por "etnia", alegando que não existe outra raça além da
humana.
Isso é aquela história brasileira de adoçar as coisas. Adoçam o racismo
específico contra os africanos e descendentes. Isso mostra, mais uma
vez, o gérmen... A alma do Brasil que manda é essa. É contra os
africanos, contra os negros. Acho lamentável. Mostra que o Brasil
continua o mesmo desde a escravidão. Mostra que, na verdade, ninguém
queria que o negro fosse liberto. Mostra que, se pudessem, colocavam,
outra vez, a escravidão.

O senhor ainda considera que a Abolição da Escravatura no Brasil não
passa de uma mentira cívica e que ainda há um hiato entre negros e
brancos no país?
É isso aí: uma mentira cívica. Uma "bela" mentira cívica. E ainda existe
um hiato entre negros e brancos. Há dois "Brasis": um dos brancos e
outro dos negros. Sem dúvida nenhuma.


O autor da proposta, senador Paulo Paim (PT-RS), afirmou que o
estatuto está longe do ideal, mas que a aprovação foi uma vitória? O
senhor concorda?
Não concordo, porque é a continuidade do racismo, da discriminação, do
desprezo pela herança africana. Essas leis, esses disfarces para não
chamar o Brasil de racista continuam. Desculpe, mas isso é odioso e, no
meu entender, vai realçar a separação, a diferença e a possibilidade dos
negros terem uma integração perfeita.

Especialmento sobre o trecho que fala das cotas, que foi suprimido do texto original. O que o senhor acha sobre isso?
As cotas são absolutamente importantes. São um passo adiante da
degradação que o negro tem sofrido durante tantos séculos.

Retirado da lista Discriminação Racial


Ana Cláudia Barros
De São Paulo
Terra Magazine.

Estatuto da Igualdade Racial: Quem divide os brasileiros?

Os detratores das políticas afirmativas contra a desigualdade racial vêem a ameaça de “racialização” do Brasil. Mas a divisão entre brasileiros de pele clara e pele escura está enraizada na escravidão e em suas marcas que sobrevivem e precisam ser superaras para soldar o fosso social em nosso país.

Mesmo mutilado, o Estatuto da Igualdade Racial, aprovado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado (dia 16) provoca reações alérgicas em setores conservadores da elite brasileira. O texto original foi desfigurado pelo relator, o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) que retirou as referências às cotas na educação, à saúde da população negra, e o incentivo para a contratação de negros pelas empresas privadas.

Mesmo assim, o texto - que foi tema de um editorial no jornal O Estado de S. Paulo com o significativo título de “Poderia ter sido pior” - foi desaprovado por seus detratores com o argumento de que ele fratura a sociedade brasileira e promove a "racialização" do país, ou a criação de um "Estado racializado".

A divisão existe e seu reconhecimento é fundamental para corrigir uma fratura histórica e consolidar a democracia no país. O argumento da racialização é uma falácia que não resiste sequer a um exame superficial. Na verdade, o que os setores conservadores e aqueles que partilham sua opinião temem não é a criação artificial de divisões entre os brasileiros. Temem o reconhecimento institucional de sua existência como herança histórica da formação do Brasil e que persiste em nossos dias penalizando a parcela dos brasileiros que descende dos africanos escravizados durante os períodos colonial e imperial e que, por trazer na pele a marca dessa descendência, constituem os setores mais oprimidos da população brasileira.

O racismo brasileiro tem características próprias e é tão perverso quanto todas as outras formas de hierarquização das populações com base em características corporais, supondo a superioridade daqueles que têm pele clara e a inferioridade dos demais. Entre estes traços está a definição da "raça" (que não é biológica, mas histórico-social) a partir da aparência e não da origem. Isto é, no Brasil, uma pessoa de pele clara é considerada branca, criando aquilo que o historiador Clóvis Moura considerava como uma válvula de escape que permitia a incorporação ao grupo "superior" daqueles que, tendo origem índia ou africana, apresentassem traços europeus.

Nos Estados Unidos, por exemplo, a definição de "raça" é diferente e não permite aquela válvula de escape pois, lá, o que conta é a origem e não a aparência, sendo considerado negro todo aquele que tiver um oitavo de sangue negro (isto é, aquele que tiver um bisavó negro), independente da cor de sua pele.

O racismo brasileiro nasceu sob a escravidão e mantém suas marcas. A definição "racial" pela aparência fundamenta a tese, falsa, de que aqui a escravidão teria sido amena e o preconceito racial inexistente - a tese da democracia racial, que passou a prevalecer no imaginário das classes dominantes a partir da década de 1930.

Uma outra característica do racismo típico de nosso país é aquela expressa através da frase antiga segundo a qual no Brasil não existe questão racial porque, aqui, o "negro conhece o seu lugar". A historiadora baiana Wlamyra R. de Albuquerque (autora de O jogo da dissimulação: abolição e cidadania negra no Brasil) demonstrou como, nos anos posteriores à abolição da escravatura, esse lugar do negro foi sancionado socialmente através de uma combinação de consenso social dos setores privilegiados com repressão pura e simples contra os ex-escravos recalcitrantes àquelas imposições.

Em consequência, o Brasil não precisou de uma legislação segregacionista porque a ordem social segregadora estava introjetada em cada pessoa, levando-as a aceitar como natural uma separação que indicava a cada um o seu lugar e que, por isso, não precisava ser explicitada através da lei. Naturalidade ainda não banida de todo e que reaparece toda vez que a presença de um ser humano de pele escura em um ambiente de brancos provoque estranheza e mesmo manifestações de hostilidade aberta. Foram criados assim - sem serem explicitamente nomeados - espaços de branco e espaços de negros. São espaços geográficos e sociais. Um exemplo é a corriqueira separação, nos edifícios, entre elevadores "de serviço" e "social", estes virtualmente proibidos para pessoas de pele escura. Mas a separação é muito mais grave, e relegou os brasileiros de pele escura aos piores lugares, aos empregos mais humildes, desvalorizados e mal-remunerados, aos cortiços e favelas, à ausência da escola; abandonados à marginalidade, à miséria e à ignorância. Os shopping centers, os locais de moradia de "alto padrão", são espaços de branco, assim como as universidades. Daí a gritaria generalizada contra o sistema de cotas que representa um rombo no muro "racializado" que restringe aos brasileiros de pele escura o acesso ao ensino superior. Era o seu lugar, sancionado pela elite, pelos costumes e pela ciência social desde o final do século 19.

Ao contrário do que pensam os detratores do Estatuto da Igualdade Racial, a divisão é histórica e resulta da exploração do trabalho escravo; da forma como a escravidão foi abolida, sob controle da oligarquia latifundiária e escravista; e da ausência de políticas de promoção social capazes de integrar à nova vida os antigos escravos libertados em 1888.

A profunda desigualdade que teve origem no período escravista se manteve e atravessou o longo período que intermedeia o fim daquele instituto iníquo e nosso tempo, no início do terceiro milênio.

Essa divisão, que resulta da "racialização" da sociedade brasileira desde sua formação histórica, tem sido demonstrada por todas as estatísticas, reiterada e monotonamente. Argumentos conservadores muitas vezes ressaltam a melhoria das condições de vida da população de pele escura. Ela reflete, mostram dois estudos publicados pelo Ipea em 2008 (Desigualdades raciais, racismo e políticas públicas: 120 anos após a abolição e As políticas públicas e a desigualdade racial no Brasil 120 anos após a abolição, organizado por Mário Theodoro) a melhoria geral nas condições de vida da população brasileira, principalmente desde a redemocratização de 1985, acentuada na década de 2000.

A novidade trazida pelos estudos do Ipea é o fato de que, nesse quadro de melhoria geral, a distância que marca a desigualdade entre os segmentos brancos e negros permanece. No quesito renda familiar, entre 1987 e 2007, os brancos sempre tiveram rendimentos médios duas vezes maiores do que os negros - oscilou em torno de 2,4 vezes até 1999, e começou a diminuir após 2001 mas, mesmo assim, mantendo-se no mesmo patamar de duas vezes maior (2,06 vezes, no número exato). "Ou seja", dizem os pesquisadores, "a população branca ainda vive com um pouco mais que o dobro da renda disponível, na média, para a população negra".

Situação semelhante foi observada em relação à educação. Em 1976, 92% dos brancos sabiam ler e escrever e somente 78% dos negros - uma diferença de 14 pontos percentuais. Desde então a universalização do ensino fundamental reduziu drasticamente essa diferença e a diferença entre os dois segmentos caiu para apenas 2 pontos percentuais, uma melhoria significativa.

Entretanto, nesse mesmo período, a exigência de maior número de anos de escolaridade formal transformou-se num diferencial que se reflete em melhores oportunidades no mercado de trabalho. E a diferença entre brancos e negros se agravou quando se considera o ensino superior. Em 1976, 5% dos brancos tinham diploma universitário, contra apenas 0,7% dos negros. Em 2006, quando os negros alcançaram a marca de 5%, os brancos haviam avançado muito mais, chegando aos 18%. A diferença que era antes de 4,3 pontos percentuais, se acentou, pulando para 13 pontos.

A mesma fratura pode ser observada na situação no emprego. Os piores empregos, como ocorre desde o final do século 19, são ocupados majoritariamente por trabalhadores negros. Eles são 60% dos trabalhadores agrícolas, 58% na construção civil, e 59% dos empregados domésticos. São também a maioria dos trabalhadores não remunerados (55%) e sem carteira assinada (55%).

O brasileiro é um povo único, formado por seres humanos de origens diferentes que aqui se fundiram no traumático e violento processo da escravidão e de suas consequências históricas. Dada a forma como se deram as relações entre povos de origens diferentes, miscigenados sob o tacão do europeu, surgiu um povo que não pode ser diferenciado mesmo porque, numa mesma família, podem haver pessoas de pele clara e de pele escura, filhos dos mesmos pais e mães. Eles criam a situação existencial na qual irmãos de pele diferente não podem, evidentemente, serem partes de povos diferentes mas de um único e mesmo povo, o povo brasileiro.

O combate contra o racismo cresce na democracia. Hoje, o Brasil vive seu mais longo período democrático, e a luta contra a desigualdade se acentua traduzindo-se em conquistas institucionais que, para serem alcançadas, precisaram superar obstáculos historicamente constituídos e alicerçados. As ações pela igualdade cresceram desde a década de 1980, traduzindo-se em medidas tomadas inicialmente por governos municipais e estaduais e, depois de 1985 e da Constituição de 1988, pelo governo federal, e que se acentuaram depois do ano 2000, principalmente após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2003, envolvendo particularmente as universidades e o Ministério Público do Trabalho.

Um dos grandes obstáculos é a alegação, feita por detratores do Estatuto da Igualdade Racial, de que a igualdade pode ser alcançada naturalmente através das políticas sociais, sendo desnecessárias as políticas afirmativas. Chegam a alegar a inconstitucionalidade das políticas afirmativas pois criariam "privilégios" para a parcela da população beneficiada, rompendo a igualdade de todos perante a lei sancionada pela Constituição.

Contra estes argumentos, os estudos do Ipea demonstram a insuficiência das políticas sociais para eliminar a desigualdade decorrente da cor da pele, cujos limites foram expostos nestes 20 anos de experiência de universalização das políticas sociais. A lentidão da mudança é visível na constatação de que, mantido o ritmo atual, a igualdade na renda familiar só poderá ser alcançada em 2029 - daqui a duas décadas. É uma velocidade histórica "demasiadamente lenta", dizem os pesquisadores do Ipea. O combate à desigualdade racial exige mais que políticas sociais, e precisa ser acelerado por políticas afirmativas que tratem os desiguais de forma desigual para que, no final, a igualdade no perfil da distribuição da renda seja alcançada. A implantação dessas políticas afirmativas vai depender de muita luta para superar os obstáculos sociais, e históricos, representados por conservadores como o senador Demóstenes Torres e O Estado de S. Paulo, marcas do atraso enraizado no passado escravista que - este sim - divide os brasileiros e oprime aqueles de pele escura. É um fosso social que precisa ser superado através de políticas específicas pela igualdade e não, como querem os conservadores, fechando os olhos para sua realidade trágica.

Por José Carlos Ruy

quinta-feira, 13 de maio de 2010

História e beleza



Pelourinho - Alcantara - Maranhão





Camboa - São Luís - Maranhão







Alcantara - Maranhão

Para Refletir

Será...
Que já raiou a liberdade
Ou se foi tudo ilusão
Será...
Que a lei Áurea tão sonhada
A tanto tempo imaginada
Não foi o fim da escravidão
Hoje dentro da realidade
Onde está a liberdade
Onde está que ninguém viu

Moço...
Não se esqueça que o negro também construiu
As riquezas do nosso Brasil

Pergunte ao criador
Quem pintou esta aquarela
Livre do açoite da senzala
Preso na miséria da favela

Sonhei....
Que Zumbi dos Palmares voltou
A tristeza do negro acabou
Foi uma nova redenção

Senhor..
Eis a luta do bem contra o mal
Que tanto sangue derramou
Contra o preconceito racial

O negro samba
Negro joga capoeira
Ele é o rei na verde e rosa da Mangueira


Composição de Helio Turco, Alvinho e Jurandir 0 Samba enrdo da Mangueira em 1988 - 100 anos de liberdade - realidade ou ilusão?

22 anos depois, o enredo continua a refletir as mazelas do povo negro.

13 de Maio - Livres do açoite da senzala, mas ainda presos na miséria da favela!

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Quem foi Aqualtune?

Aqualtune Ezgondidu Mahamud da Silva Santos, conhecida por Aqualtune, era uma princesa africana filha do importante Rei do Congo, viveu no século XVII. Numa guerra entre reinos africanos, comandou um exército de 10 mil guerreiros quando os Jagas invadiram o seu reino.
Derrotada, foi levada como escrava para um navio negreiro e vendida ao Brasil, chegando no Porto de Recife, principal centro produtor de açúcar e entreposto comercial da América Portuguesa.

Comprada como escrava reprodutora e obrigada a manter relações sexuais com um escravo, para fins de reprodução, já grávida foi vendida para um engenho de Porto Calvo, no sul de Pernambuco, onde pela primeira conheceu então a trajetória de Palmares, um dos principais Quilombos negros durante o período escravocrata, e as histórias de resistência dos negros à escravidão. Nos últimos meses de gestação organizou a sua fuga e a de alguns escravos para aquele quilombo onde teve sua ascendência reconhecida já que Aqualtune era uma princesa, recebendo então o governo de um dos territórios quilombolas, onde as tradições africanas eram mantidas e cada mocambo organizava-se de acordo com suas próprias regras.
Este tinha uma grande dimensão territorial, com inúmeros povoados fortificados, onde os ex-escravos preparavam a organização de um estado negro naquelas terras. Mantinham a tradições africanas e seus ritos originais; assim o governo de cada localidade era dado aos que em sua terra tinham sido chefes.

Começou, então, ao lado de Ganga Zumba, seu filho, a organização de um Estado Negro, que abrangia povoados distintos, confederados sob a direção suprema de um chefe. Dois de seus filhos, Ganga Zumba e Gana Zona tornaram-se chefes dos mocambos mais importantes do quilombo. Aqualtune também teve filhas, a mais velha das quais, chamada Sabina, deu-lhe um neto, nascido quando Palmares se preparava para mais um ataque holandês. Por isso, os negros cantaram e rezaram muito aos deuses, pedindo que o Sobrinho de Ganga Zumba, e, portanto, seu herdeiro, crescesse forte. Para sensibilizar o deus da guerra, deram-lhe o nome de Zumbi. A criança cresceu livre e passou sua infância ao lado de seu irmão mais novo chamado Andalaquituche, em pescarias, caçadas, brincadeiras, ao longo dos caminhos camuflados, que ligavam os mocambos entre si. Garoto ainda, Zumbi conhecia Palmares inteiro. Passam-se os anos e Palmares tornou-se cada vez mais uma potência. Mais de 50.000 habitantes livres, distribuídos em vários mocambos. Zumbi cresceu e casou-se com Dandara."

A guerra comandada pelos paulistas para destruir o quilombo de Palmares é uma das páginas mais dolorosas da história do Brasil. Em 1677, a aldeia de Aqualtune, que já estava idosa, foi queimada pelas expedições coloniais. Não se sabe a data de morte de Aqualtune, mas os quilombolas permaneceram lutando até serem finalmente derrotados, em novembro de 1695, pela bandeira do paulista Domingos Jorge Velho.

Fontes:

- Caderno de Formação do MNU - Movimento negro Unificado;
- Dicionário Mulheres do brasil - De 1500 até a atualidade biográfico e ilustrado. Jorge Zahar Editor, 2000.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Ciclos (re)fletidos em Fortaleza - TeiaBrasil 2010 - Tambores Digitais


Mitologia afro-brasileira e Contemporaneidade

A nossa história é agente quem faz a partir de encontros e (re) encontros, contadas pelos ancestrais e (re) contada na contemporaneidade. Desta forma a performance Ciclos (re)feltidos busta na (re) significação dos mitos afro-brasileiros a compreensão da identidade afro-brasileira. 
Concebida por Lucinete Araújo e Líria Gomes, é um fragmento extraído do Espetáculo Ciclos Refletidos que foi o resultado do trabalho constituído durante três meses da residência artística em dança, de Lucinete Araújo, no Ponto de Cultura Espaço Cultural Pierre Verger, com o Projeto Conto e Reconto contemplado com o Prêmio Interações Estéticas - Residências Artisticas 2008, em Pontos de Cultura da FUNARTE.
O Projeto Conto e Reconto, tem por objetivo buscar a conectividade entre dança contemporânea, mitologia afro-brasileira e corpo afro-descendente pois percebe-se a constituição de um elemento que está fundamentado na relação interativa da individualidade do sujeito com o ambiente em que convive e sua cultura.
Assim promove o fortalecimento da cultura afro-brasileira que é predominantemente oral e que mantém como tradição a narração de mitos como forma de conhecer a história de povos, pensamentos, crenças e costumes que foram transmitidos de geração para geração através de diferentes acontecimentos passados servindo com reflexão para aproximação ou reconciliação da cultura com as ciências e com a vida na elaboração dos saberes e fazeres.


quinta-feira, 28 de janeiro de 2010